Em nossas reflexões sobre educação e cultura, é fundamental dar voz às práticas que subvertem o paradigma centrado na perspectiva ocidental e expandem a noção de alfabetização e expressão artístico-pedagógica. A trajetória de Liça Pataxoop — educadora, artista, liderança da aldeia Muã Mimatxi (Itapecerica/MG) — oferece um horizonte inspirador nesse sentido.
Embora não tenha sido alfabetizada segundo os moldes da institucionalização escolar, Dona Liça é professora na sua aldeia. Como diz: “o estudo de fora eu não tive; o meu estudo é tradição, terra, céu, vovô sol, vovó lua”. Declaração que revela a dimensão epistemológica contida na união entre saberes ancestrais, natureza e modos outros de se produzir conhecimento – um fazer vivo que tece a vida em comunidade.
“o estudo de fora eu não tive, o meu estudo é tradição, terra, céu, vovô sol, vovó lua.” [D.Liça Pataxoop]
O “Têhêy” como pedagogia visual
No coração de sua prática docente está o uso dos Têhêys: redes de pesca que viram metáforas gráficas para “pescar” conhecimento. Para ela, o desenho é escrita: cada traço “narra vivências e saberes da cultura Pataxoop”. Os Têhêys são mapas culturais, nascidos da oralidade e convertidos em imagens que dialogam com gerações de forma simbólica, sensível e multifacetada.
Em uma única composição, os Têhêys agregam geografia, história, cosmologia, botânica e relações de afetividade com o povo e com o território. Não são desenhos estáticos e nem ilustrativos, mas narrativas em movimento: “neles ensino valores da vida, da natureza, de nossa ancestralidade” (D. Liça Pataxoop, 2025).
Sua arte opera pedagogicamente, eternizando a memória Pataxoop e construindo pontes com quem não pertence à sua cultura. Ao educar crianças, indígenas ou não, Dona Liça afirma inclusão no que ensina, seus métodos são interculturais. A dimensão política do seu trabalho reforça sua prática educadora, que respeita e renova alicerces de suas tradições.

Suas produções artísticas e pedagógicas nos fazem questionar alguns papéis na universidade:
- Que lugar damos, em nossos currículos de formação, às linguagens visuais e gráficas como meios de expressão e ensino?
- Como acolher pedagogias originárias que subvertem a hegemonia da palavra escrita dentro de ambientes acadêmicos?
- De que forma podemos criar “espaços de escuta” que permitam ao saber indígena ocupar, por direito, os labirintos institucionais da universidade?
Se pensarmos a educação como território de encontros, Dona Liça Pataxoop nos ensina que é nessa tessitura ancestral que podemos reimaginar o que significa ensinar e aprender. Que seus Têhêys continuem dialogando e criando espaços de diálogo, como redes que se espraiam e pescam peixes, mas também sentidos, vidas e existências diversas.
Projetos e visibilidades
Suas expressões circulam e dialogam com diferentes públicos, transformando o espaço urbano em galeria ancestral. Como revela a empena do edifício Leblon na Praça Raul Soares, iniciativa do Cura – Circuito Urbano de Arte – e também os tapumes da fachada do Memorial Minas Gerais Vale, na Praça da Liberdade, em BH.


Bem como, a oficina Raízes Desenhadas: Visões e Cores Pataxoop, presente na programação do “Agosto Indígena”, no Espaço do Conhecimento UFMG, que convidou o público a “pescar” com o olhar e entrar em contato com as memórias ancestrais desse povo. D. Liça foi convidada especial na FLIP – Festa Literária Internacional de Paraty, também em agosto, que contou com outros nomes que, assim como o dela, pensam a educação em diálogo com outros modos de produzir conhecimento.
A convite do Projeto de Extensão “Arte e Cultura nos Espaços Expositivos da FaE”, coordenado pela prof.ª Daniele De Sá Alves, com o apoio da Pró-Reitoria de Cultura (PROCULT) e da Diretoria da Faculdade de Educação, Liça Pataxoop marca a presença e a força da cultura indígena com seu Têhêy “Pescaria de Conhecimento” em uma das paredes da fachada da FaE.
Um grande mural de 8 metros de altura foi pintado por ela com a ajuda de filhos e netos, além do apoio da equipe do projeto de extensão. O processo contou com o apoio de toda uma equipe de segurança, desde o aluguel dos quatros andares de andaime até o engenheiro de segurança em altura. Todos da equipe fizeram uma formação para a realização da pintura com equipamentos de proteção individual e supervisão de um especialista para que tudo pudesse ser feito sem nenhum risco para os artistas do grupo executor. O início dos trabalhos se deu em setembro de 2025, sendo finalizado em outubro do mesmo ano. Toda a comunidade acadêmica pôde acompanhar as etapas do processo e, agora, celebram a produção finalizada num momento especial de inauguração.
A inauguração do Têhêy criado pela D. Liça, especialmente para a FaE, será na próxima terça-feira, 28 de outubro, às 17 horas, a data foi cuidadosamente escolhida em função da presença dos estudantes do FIEI – Formação Intercultural de Educadores Indígenas – que estão, nesse mês de outubro, desenvolvendo as atividades do “Tempo-Escola” na FaE. Todos estão convidados para esse momento de celebração, cultura e resistência!

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