
A artista e ex-aluna da licenciatura de artes visuais da UFMG, Bárbara Elizei, retorna à instituição para partilhar sua produção artística. Para quem acompanha seu trabalho, em sua primeira exposição individual intitulada “Trezentos e dezoito quilômetros de mundo”, realizada no Museu de Artes e Ofícios (BH), em 2024, a paisagem apareceu como gesto artístico que nos provocou e convidou a refletir sobre o espaço-tempo e quem somos ao nos deslocarmos, anunciando, de certa maneira, outra composição que estava por vir: Arredores.
Neste contexto, os “Arredores” apresentados em novembro no Espaço de Poéticas (FaE/UFMG) são, tanto a periferia de um mapa, quanto o limiar íntimo de um sentir: o que sobra da viagem, o que se encontra nas margens, o que se move no vai e vem. Viajar não é somente ir, mas também voltar, ou melhor: retornar transformado. Essa poética de trânsito convida o espectador a caminhar entre paisagens visíveis e invisíveis, entre o que resta e o que é metamorfose.
A exposição remonta trajetos como o da BR-381, entre Varginha e Belo Horizonte, onde Elizei recolhe imagens, placas, marcas de passagem, horizontes que escapam, e faz delas matéria para pintura, fotografia, vídeo e instalação.
Essa rodovia, no seu entre-lugar, torna-se mapa afetivo: cada quilômetro, cada curva, cada fresta de vegetação ou asfalto, cada placa dominada pelo tempo ou apagada pelo vento, registra uma memória. “A estrada como a linha do tempo constante em nossas vidas”, diz a artista (2024).

O ir e o vir (circular, deslocar, retornar) aparece como pulsação do trabalho. Em “Trezentos e Dezoito Quilômetros de Mundo” (2024) ela já mapeava esse deslocamento cartográfico e afetivo entre dois lugares, e agora, em Arredores, o percurso se amplia para bordas, margens, espaços de transição.
E assim, o espectador é convidado a uma contemplação que viaja: não apenas entre telas ou suportes, mas entre sentidos. O que é ir para cá ou para lá, senão definir-se ou perder-se no caminho? O que é redor, senão aquele invisível que contorna o visível, que sustenta o espaço e que habitualmente escapamos?
Nos arredores encontram-se sinais das territorialidades presentes em movimentos de travessia, como aponta Elizei em sua investigação sociopolítica da paisagem. Mas também, e sobretudo, encontram-se poéticas: o sopro do vento na junção do asfalto e da vegetação, a luz que incide no momento exato em que o carro passa, a textura da estrada que ecoa no corpo do viajante. Nessa dialética entre o bruto e o sutil, a artista abre uma fissura, uma fresta pelas quais o olhar se projeta além do horizonte.
No percurso expositivo, cada obra funciona como um fragmento de estrada, uma anotação de viagem, uma pausa ou uma aceleração. O visitante caminha, perambula entre esses fragmentos, e no deslocamento encontra-se também parado. Porque viajar não requer velocidade apenas, mas consciência do entorno. A atenção ao arredor. O acontecimento. Como escreveu Deleuze (2006, p.328): “os nômades são aqueles que não mudam, e põem-se a nomadizar para permanecer no mesmo lugar, escapando dos códigos”.

Nesta exposição, Bárbara Elizei oferece pistas para que o espectador descubra seus próprios arredores. Pois a arte não aponta caminhos prontos, mas abre veredas para que caminhemos. A obra torna-se companheira de estrada, diferente a cada passo. Neste fluxo, além de várias pinturas já finalizadas, e duas instalações artísticas, a artista convida o público a acompanha-la no próprio movimento da forma, com uma obra inacabada que seguirá sendo pintada no decorrer do período de visitação.
Quando deixamos o centro e voltamos para os arredores, percebemos que é ali que mora o deslocamento, o movimento, o devenir. O ir e vir, seja no automóvel, no corpo, no pensamento, torna-se gesto de consciência. Da paisagem que habita e da paisagem que somos. O viajante e o que habita. O que parte e o que regressa. Ambos formam essa cartografia.
Ao término da visita, não saímos iguais aos que entraram. As paisagens que atravessamos permanecem conosco. O arredor que antes parecia marginal, periférico, torna-se eixo de sentido. No silêncio da viagem, no ritmo do percurso, no vai e vem do olhar, descobrimos: os arredores também nos percorrem.
A exposição “Arredores” integra o projeto de extensão “Arte e Cultura nos Espaços Expositivos da FaE” e estará disponível para visitação até o mês de março de 2026.
SERVIÇO:
Exposição: Arredores
Artista: Barbára ELizei
Curadoria: Daniele de Sá Alves
Produção: Rayane Silva, Lorena Gonçalves e Zinho Marques;
Local: Espaço de Poéticas – FAE/UFMG (Campus Pampulha em Belo Horizonte / MG)
Data: De 04/11/25 a 14/14/2026
Para saber mais: @espacodepoeticasfaeufmg; @barbara.elizei;@espacoarteducacaofaeufmg











