
Se você ainda não conhece, chegou o momento de descobrir essa iniciativa incrível que nasceu da Faculdade de Educação (FAE) e tem transformado a forma como nos relacionamos com o mundo acadêmico. O Coletivo Linha da FaE é, acima de tudo, um espaço de acolhimento, troca e luta pela defesa da educação pública. O projeto ganha corpo com a Roda de Bordados, encontros semanais que unem sensibilidade, aprendizado e reflexão sobre temas essenciais como as memórias de escola.
Venha entender como a linha, a palavra e o gesto coletivo podem contribuir para a construção de uma educação mais inclusiva e transformadora!
As respostas foram fornecidas pela equipe do Linhas da FAE.
Quem idealizou o Linhas da FAE e de onde surgiu a ideia ou iniciativa para o projeto?
O projeto de extensão “Linhas da FaE: Coletivo de bordado livre em defesa da educação pública” advém de uma experiência online construída durante a pandemia de COVID-19, em 2021, quando um grupo de docentes e discentes da Faculdade de Educação (FaE/UFMG), junto com público externo, produziu um “Dicionário bordado” em homenagem ao centenário de Paulo Freire, posteriormente transformado em um livro virtual* e em uma exposição presencial no espaço ArtEducação da FaE/UFMG, intitulados “Entre a linha e a palavra: bordados para Paulo Freire” (LINHAS DA FAE, 2021). Com o retorno das atividades presenciais em 2022, a mobilização do grupo ganhou força e docentes da referida Faculdade se organizaram para constituir o Coletivo, que visa à defesa da Educação pública em um cenário de ataque aos direitos da população brasileira. o Coletivo possui uma equipe de Coordenação compartilhada, hoje realizada pelas Professoras Álida Angélica Alves Leal, Daniele de Sá Alves e pelo Professor Filipe Santos Fernandes.
Uma das nossas inspirações para a criação do projeto reside no trabalho das arpilleras da resistência chilena, expressão estética e política do bordado. A Arpillera é uma técnica têxtil chilena que consiste em contar histórias através do bordado, suas raízes situam-se em uma antiga tradição popular criada por um grupo de mulheres bordadeiras de uma localidade denominada Isla Negra, na costa central chilena. A folclorista Violeta Parra foi quem ajudou na difusão desse trabalho artesanal a partir de meados da década de 1960. Certa vez, declarou numa entrevista: “As arpilleras são como canções que se pintam” (Álida Leal, Josaniel Silva e Marília Dias, 2014, p. 124). Para ela, tal bordado é uma uma linguagem para poder transmitir histórias, sonhos e conceitos.
Durante a ditadura militar chilena (1973-1990), muitas mulheres que tiveram seus familiares torturados, sequestrados e/ou desaparecidos passaram a confeccionar bordados de maneira coletiva, em igrejas, associações etc, narrando suas histórias de injustiça, dor e, também, de muita resistência. Em geral, as obras tinham como base recortes de um saco de arpillera (juta, em espanhol), por meio dos quais eram feitas denúncias de diversas situações de opressão, subalternização, violência e abandono, constituindo expressões da tenacidade com que levavam adiante a luta pela verdade e pela justiça. No período supramencionado, as arpilleras chilenas circularam em diferentes cantos do mundo, levando consigo as indignações e esperanças de uma população que passava a lutar contra o projeto neoliberal chileno levado à cabo pelo governo ditatorial, então pioneiro em terras latino-americanas (COMISSÃO DE ANISTIA DO MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2012).

Ainda como inspiração para nosso projeto de extensão, destacamos a experiência de Coletivos criados em diferentes cidades do Brasil, conectados em um grande novelo, cuja iniciativa primeira é a do Coletivo “Linhas do Horizonte”, do município de Belo Horizonte/Minas Gerais. O Coletivo, fundado no ano de 2016, caracteriza-se como suprapartidário e de esquerda. Por meio do chamado “bordado político”, atua na defesa de diferentes causas políticas e sociais e na defesa da democracia. Inspirados em tal iniciativa, outros grupos foram criados em diferentes regiões do Brasil, tais como: “Linhas do Rio”, “Linhas de Santos”, “Linhas do Mar”, “Linhas de Porto Alegre”, “Linhas da resistência”. Com foco na defesa ambiental, o projeto “Linhas das montanhas – bordando águas” também ganha destaque.
Dentre tantas possibilidades advindas da prática do bordado, salientamos o exercício da alteridade, que encontra lastro no que Luciana Brandão (2010) chamou de “Pedagogia da dádiva”: a possibilidade e a boniteza de compartilhar o que se sabe e aprender o que não se sabe; em situações marcadas por trocas e reciprocidades. No Coletivo “Linhas da FaE”, entendemos que esta prática dialoga com o que há de mais potente na Educação popular: a formação humana numa perspectiva emancipatória, entendendo os sujeitos como incompletos, que se educam entre si, mediados pelo mundo. O bordado nos permite transbordar, transgredir tempos e espaços, indagar processos educativos pensados a partir da compreensão do sujeito como assujeitado, despido de suas emoções, seus sentimentos, de seu modo de ser e estar no mundo. Permite outras costuras, alinhavos…. Alfredo Bosi, em “O trabalho das mãos” (2000), diz “que a mão é a voz do mundo, é voz do surdo, é leitura do cego”. Em nosso caso, as linhas são nossas vozes e expressam, de certa forma, nossas inquietudes e nossos desejos na construção de uma educação brasileira autêntica na perspectiva freireana, que, aos poucos, dê conta de espelhar a diversidade de pensamentos e modos de ser desse Coletivo.
* Os nomes dos/as participantes encontram-se registrados no Livro, disponível aqui.
Como funciona operacionalmente o projeto?
Em termos de gestão dos processos, o Coletivo possui uma equipe de Coordenação compartilhada, responsável pela organização dos fluxos de trabalho do projeto, diálogo com membros internos e comunidade externa, entre outros. Atualmente, o projeto não conta com bolsistas e financiamento externo, apenas com pessoas voluntárias e visitantes. O grupo realiza uma atividade fixa (Roda de Bordados) e, também, outras atividades de cunho eventual. As “Rodas de bordados” são realizadas por meio de encontros semanais às quartas-feiras, de 17:00 às 19:00, na Faculdade de Educação. Esta atividade gira em torno de eixos temáticos escolhidos coletivamente pelos/as participantes (a título de exemplo, atualmente, nos organizamos em torno da temática “Memórias de escola”). Quanto às atividades eventuais, o grupo está disponível para o diálogo com o público interno e externo à UFMG e recebe convites para participação em ações diversas (oficinas, minicursos etc). Estas demandas são avaliadas pela equipe de coordenação e oportunamente compartilhadas com os/as demais participantes, para avaliação da participação do coletivo.
De quais formas os(as) alunos(as) podem participar?
Estudantes de graduação e pós-graduação da UFMG, assim como demais pessoas vinculadas à universidade e público externo podem participar do projeto como voluntários. Neste caso, a demanda é pela dedicação de duas horas semanais (no mínimo) às atividades propostas pelo grupo – atualmente, nossas “Rodas de bordados”, realizadas às quartas-feiras, de 17:00 às 19:00, na FaE/UFMG. Eventualmente, há outras atividades para as quais estas pessoas também são convidadas a participar (oficinas, minicursos, eventos diversos etc). Com relação às “Rodas de bordados”, pessoas interessadas também podem participar como visitantes, sem se comprometerem semanalmente com as ações do grupo. Neste caso, se assim o desejarem, recebem certificado de participação por atividade.
Qual a contribuição do projeto para a vida dos(as) participantes, sejam bolsistas, visitantes ou coordenadores(as)?
Provocadas por esta pergunta, lançamos uma chamada em nossa página no Instagram, perguntando às pessoas que participam ou já participaram do projeto qual o significado dessa participação para elas. Ao discutir sobre esta atividade, também foi possível circular a palavra em uma de nossas rodas de bordado, o que nos dá elementos para pensar sobre o tema em questão.
A força da coletividade e o encontro com as outras pessoas é um dos aspectos que mais movimenta as pessoas em torno do projeto. Neste sentido, o valor do fazer coletivo, do diálogo e do encontro com diferentes pessoas e experiências ganha centralidade. A expressão criativa e sensível por meio do bordado também é mencionada como elemento importante, sendo meio de elaboração de sentimentos e reflexões. A reflexão crítica e afetiva sobre a educação, que leva à transformação pessoal, profissional e social, também ganha destaque. Misturando sentimentos e palavras, ouvidas e registradas, podemos dizer que, para os/as participantes, guardadas diferenças entre eles/as, o Linhas é uma oportunidade de encontro com o outro, com as potencialidades e possibilidades de viver e estar no mundo. É experiência coletiva, é diálogo e companhia; lugar de escutar e aprender sobre educação e outras experiências. É espaço-tempo de pausa e tranquilidade em meio à rotina atribulada. Significa reconhecimento do outro e de si potencializado pelas mãos que criam. É uma oportunidade de desenvolver trabalhos cheios de sensibilidade, plenos de bonitezas. O Linhas é lugar de construir novas formas de reivindicação, de luta, de potencialização da cultura. Espaço para trocar, aprender, pensar e repensar a educação: a formação, os currículos, os tempos, os espaços e, especialmente, seus sujeitos, individuais e coletivos. É movimento, reflexão-ação sobre os afetos/sentires na construção coletiva dos conhecimentos; especialmente das formas de expressões não reconhecidas academicamente. Lugar de falar por meio das agulhas e linhas para transbordar, para se inspirar, resistir, transformar. É um território de encantamento e, também, de produzir felicidade.
https://www.instagram.com/p/DJrm_PYR6GK/ Boton “Produzir felicidade”

Na sua opinião, qual a importância das trocas que ocorrem durante os encontros?
Quando temos a oportunidade de conversar sobre o projeto, “refúgio” e “abrigo” têm sido palavras usadas de forma recorrente para caracterizar as implicações do projeto na vida das e dos participantes. Em tempos marcados por uma Academia cada vez menos afetuosa, em que as relações são definidas pela produção e pela burocratização, o projeto é um hiato no qual elementos sensíveis circulam para ressignificar os processos educativos nos quais os e as participantes estão imersos, sejam eles escolares ou não. As trocas oportunizadas pelos encontros não se restringem, por isso, ao ato de bordar, mas buscam no bordado um motivo para, coletivamente, engendrar conhecimentos, valores, ações e emoções em torno da educação e da docência.
Gostaria de acrescentar algo?
Gostaríamos de reforçar a importância das publicações das ações promovidas pelo Linhas da FaE na Página do Instagram da FaE. Estas repostagens têm potencializado, e muito, diálogos com o público interno da Faculdade e, também, externo.
Se interessou pelo projeto e quer mais informações? Acesse o instagram @linhasdafae





