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Manifesto em apoio à Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva

sexta-feira, 16 de outubro de 2020, às 10:35

Manifesto em apoio à Educação Especial na perspectiva da
Educação Inclusiva


         Manifestamos nossa posição de repúdio ao Decreto Federal de nº 10.502, publicado no dia 1º de outubro de 2020, que institui a “nova” Política Nacional de Educação Especial, intitulada Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao Longo da Vida. Repudiamos por considerar que esse documento ameaça direitos conquistados a partir da Constituição Federal de 1988 – reconhecida como um dos marcadores mais importantes no sentido de responsabilizar o Estado brasileiro pela implementação de ações que efetivem o direito à educação escolar -, bem como a partir da Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional, Lei nº 9.394/1996, comprometendo, desse modo, o processo de implementação de políticas públicas de inclusão escolar – em todos os níveis, etapas e modalidades de ensino.
Como evidenciam estudos do campo da educação, a oferta de escolarização para estudantes da Educação Especial em instituições públicas se deu tardiamente no Brasil. Ao longo do século XX, o atendimento a estes sujeitos foi oferecido basicamente por instituições privadas, de caráter filantrópico, as quais desempenharam e ainda desempenham papel importante na definição de políticas públicas no âmbito da Educação Especial. Estas recebiam recursos públicos em troca de serviços endereçados a esses estudantes, desresponsabilizando, dessa forma, o Estado pela oferta de escolarização a
esses sujeitos.
Com todos os limites e desafios, foi a partir do final dos anos 1990 que o Brasil passou a estruturar melhor a sua rede pública de ensino, ampliando, gradualmente, o acesso à educação básica para a população em idade escolar. Nesse cenário, ampliava-se, também, a oferta de vagas aos estudantes da Educação Especial, ao mesmo tempo em que
crescia o debate em torno da inclusão escolar.
Pode-se dizer, este processo de democratização da educação escolar representa um tempo histórico relativamente curto, atravessado por diferenças regionais que compõem nosso país – continental e desigual.
A partir dos anos 2000, o Brasil se alinha às orientações internacionais, priorizando a educação desses estudantes em escolas comuns, como atestam documentos oficiais desse período, culminando na Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva – PNEEPEI, de 2008.
A orientação em torno de uma perspectiva inclusiva referenciou a definição de políticas educacionais locais e a estruturação de redes de ensino; o estabelecimento de percursos de escolarização da Educação Infantil ao Ensino Superior; a construção de parâmetros para a formação inicial e continuada de professores; a definição da alocação
de recursos públicos, dentre outros aspectos essenciais.

         Diante disso, consideramos que a “nova” Política de Educação Especial significa uma grave ruptura do processo de democratização do direito à educação escolar pelas pessoas com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento, transtorno do espectro autista, altas habilidades ou superdotação, pois reintroduz a possibilidade de que haja
espaços educacionais exclusivos para esse público, como as escolas e classes especiais. Além disso, o documento amplia a possibilidade de que os recursos públicos sejam destinados a instituições privadas, retrocedendo a um período anterior à Constituição Federal de 1988.
       Entendemos que os desafios existentes no processo de inclusão escolar devem ser identificados, avaliados e analisados na perspectiva de ampliação do direito à educação escolar na escola pública, estatal, laica e de gestão democrática.
É mister que neste momento político vimos sofremos ataques constantes contra a democracia, ainda tão sensível em nosso país; ataques contra direitos em todas as áreas e que colocam em risco a própria vida. Assim, não é de estranhar que uma “nova” política que retroceda algumas décadas seja forjada neste contexto de desmonte de tudo aquilo que é público.
Dessa forma, nos manifestamos favoráveis à revogação imediata do Decreto nº 10.502/2020 e à ampliação do debate em torno das políticas de Educação Especial que possibilitem a escolarização efetiva dos sujeitos público dessa modalidade de ensino em espaços comuns.


Assinam este manifesto as professoras pesquisadoras do campo da Educação Especial da Faculdade de Educação da UFMG.
Belo Horizonte, 15 de outubro de 2020.

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